quarta-feira, 11 de março de 2009

Justiça Federal quebra sigilo telefônico de Protógenes e retira segredo de inquérito

O juiz Ali Mazloum, da 7ª Vara Criminal da Justiça Federal, autorizou a quebra do sigilo telefônico do delegado Protógenes Queiroz, que coordenou a Operação Satiagraha, da Polícia Federal. Ao ser deflagrada em julho, a operação prendeu Daniel Dantas, dono do grupo Opportunity, o ex-prefeito de São Paulo Celso Pitta e o investidor Naji Nahas, entre outros.
Responsável pelo inquérito que apura o vazamento de informações da Satiagraha, Mazloum decidiu também retirar o segredo de Justiça de parte do inquérito. Permanecem restritos alguns documentos e todos os áudios e mídias eletrônicas.
A quebra do sigilo telefônico, solicitada pela PF, corresponde ao período entre fevereiro e agosto de 2008, quando houve cooperação de agentes da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) na operação.
A decisão, tomada no dia 4, foi tornada pública ontem. Mas ainda na semana passada Mazloum enviou cópia do inquérito para a CPI dos Grampos, no Congresso. Dois dias depois, a revista "Veja" publicou reportagem afirmando que autoridades dos três Poderes foram investigadas ilegalmente.
Ao explicar, em nota, a retirada do segredo de Justiça, Maz- loum disse que "a manutenção do segredo tem servido para o vazamento seletivo de informações, geralmente falsas, para desqualificar a apuração".

Prorrogação da CPI
As denúncias da revista motivaram ontem na Câmara a prorrogação, pela quinta vez, da CPI, que ganhou sobrevida de 60 dias, prorrogáveis pelo mesmo período. O prolongamento foi aprovado na comissão e confirmado minutos depois pelo plenário da Casa. A CPI funciona há 14 meses e se preparava para votar o relatório final, mas voltou atrás.
Hoje, os deputados da CPI se reúnem para votar requerimentos de convocação. Já existem propostas apresentadas para novos depoimentos de Protógenes e do ex-diretor-geral da Abin Paulo Lacerda. Se confirmado, será o terceiro depoimento dele à CPI. Lacerda é acusado de ter omitido a participação de agentes da agência em depoimento à comissão.
O relator da CPI, Nelson Pellegrino (PT-BA), havia apresentado a primeira versão do relatório sem indiciamentos. Ontem, admitiu rever o texto diante das novas denúncias. "Vamos acrescentar nomes e CPFs ao relatório que já aponta a grampolândia no país."
Mesmo com mais dois meses de CPI pela frente, o presidente da comissão, Marcelo Itagiba (PMDB-RJ), apresentou voto em separado no qual solicita o indiciamento de Protógenes, de Lacerda, do ex-diretor-adjunto da Abin José Milton Campana -nos três casos por falso testemunho à CPI- e de Dantas -pela acusação feita em 2001 de interceptação telefônica ilegal de conversa entre o empresário Paulo Marinho e o jornalista Ricardo Boechat.
"Já há indícios suficientes de que eles mentiram à CPI. Isso já basta para o indiciamento", disse Itagiba. A partir da análise do inquérito da Corregedoria da PF, que começou ontem, os deputados esperam encontrar indícios da participação deles em interceptações ilegais.
O ministro Tarso Genro (Justiça) disse que a investigação da PF, aberta para apurar denúncias de espionagem ilegal atribuídas à Satiagraha, indica a existência de "graves irregularidades".
Ontem, o ministro afirmou que a investigação sobre a conduta de Protógenes é "uma forma boa e correta de proteger a sociedade".
Em Recife (PE), o delegado disse que não confirma "nenhuma linha da reportagem". "Estão tentando macular a imagem do presidente Lula, da ministra Dilma [Rousseff], com mentiras. A revista ["Veja"] traz notícias mentirosas. É uma montagem e alguém tem que ser responsabilizado", disse o delegado. (ANA FLOR, ALAN GRIPP e LUCAS FERRAZ)

Justiça dos EUA desbloqueia US$ 50 mi do Opportunity

Juiz decide manter indisponível, porém, a conta com maior saldo, cerca de US$ 400 mi

Valores foram congelados a pedido do Brasil, que tem até fim de março para dar "boas razões" para que a ordem de retenção seja ampliada

LILIAN CHRISTOFOLETTI
DA REPORTAGEM LOCAL

O Departamento de Justiça dos Estados Unidos determinou ontem o desbloqueio de parte dos cerca de US$ 450 milhões mantidos pelo Banco Opportunity, de Daniel Dantas, naquele país. Os recursos estavam congelados a pedido de autoridades brasileiras desde o dia 15 de janeiro.
Segundo o Ministério da Justiça, a quantia pode chegar a US$ 500 milhões, mas o governo brasileiro ainda não sabe o valor exato. A Folha apurou que é de aproximadamente US$ 450 milhões.
Pela decisão do juiz John B. Bates, do Distrito de Colúmbia (Washington, DC), apenas uma conta bancária -de um total de seis localizadas nos EUA- continuará indisponível. O congelamento foi mantido sobre a conta de maior saldo, cerca de US$ 400 milhões, aberta no Brown Brothers Harriman.
Mas o juiz deu um prazo para a manutenção do bloqueio: até 31 deste mês. Até lá, o Brasil terá de apresentar "boas razões para que [a Justiça dos EUA] amplie a ordem de retenção".
Dantas é investigado na Operação Satiagraha por supostos crimes financeiros. Em dezembro, foi condenado a dez anos de prisão e a pagar R$ 13,42 milhões por tentar subornar policial federal para que seu nome fosse excluído do inquérito.
Como medida de segurança para eventuais decisões no Brasil, no sentido de recuperar recursos devidos aos cofres públicos, o país pediu a indisponibilidade de todos os valores mantidos pelo Opportunity no exterior -segundo o Ministério da Justiça, o bloqueio internacional é de US$ 2 bilhões.
De acordo com a decisão de Bates, as contas são de Dantas ou de seu entorno pessoal e profissional.
Foram liberados os montantes localizados nos bancos UBS AG e USB Securities. A conta que segue bloqueada (número 8.870.792), no banco Brown Brothers Harriman, está em nome da empresa "Tiger Eye Investments Ltd." -literalmente "Olho de Tigre".
Para a PF, o montante pertence a Dantas e saiu do Brasil de forma ilegal, via doleiros.

Revisão
A decisão do juiz americano retificou ordem que havia sido dada por ele dois dias antes, de desbloqueio total dos valores.
Numa decisão, do dia 8, o magistrado justificou que o Brasil não cumpriu todos os requisitos legais exigidos pela Constituição americana, como ter apresentado ação condenatória contra Dantas já finalizada.
No Brasil, não há um processo formal contra o banqueiro por crimes financeiros. O caso ainda está na PF, na forma de inquérito (investigação). Apenas após a conclusão deste trabalho, o Ministério Público Federal poderá pedir a abertura de uma ação na Justiça.
O secretário do Ministério da Justiça, Romeu Tuma Júnior, afirmou que é um "desastre" a decisão do juiz americano, pois contraria todas as normas internacionais. "O juiz cobra do Brasil uma sentença transitada em julgado [finalizada]. Mas estamos falando de um caso de bloqueio, não de repatriação, o que contraria uma série de acordos internacionais, abre uma crise entre países. A Convenção de Palermo prevê justamente o bloqueio para situações como essa", disse Tuma.
O procurador da República Rodrigo de Grandis disse que o juiz não avaliou o mérito da investigação, mas o aspecto formal, que é a ausência de condenação transitada em julgado. "Isso não atrapalha a investigação, mas acho que a decisão é um precedente ruim, contraria normas internacionais."
Os advogados de Dantas e do Opportunity, Andrei Zenkner Schmidt e Antonio Sérgio Moraes Pitombo, respectivamente, disseram ontem que ainda não haviam analisado a nova decisão. Alegaram também que o caso está sob sigilo.